As “velhas” atrizes que representam no palco “o futuro de uma ilusão” atingem o ponto culminante de fascinação e angústia no público espectador ao mobilizá-lo à reflexão sobre a sexualidade no entardecer da vida, a solidão do “se eu morresse amanhã…” e a morte. Ou, o que é pior, a morte da cidadania do sujeito asilado, institucionalizado no cárcere da ignorância e do abandono. Lugar para muitos reservado como única alternativa de sobrevida por uma estrutura social cujo discurso está apenas dirigido a um segmento consumidor, economicamente ativo (ou seja, com poder aquisitivo). Uma estrutura que, quiçá para defender-se do espelho da decadência (ou da castração), condena por descaso o velho que represente a evidência do devir humano e de sua temporalidade.
Mais do que um impacto que denuncia o que acontece, esta peça me parece um chamado à reintrojeção, isto é, uma proposta de movimentação das pessoas alienadas do discurso dominante para um outro discurso. O daquele que não tem oportunidade de dizer. Pois mesmo que o faça, não há quem queira ouvi-lo.
Aquele condenado à marginalidade mais cruel por ter sido declarado culpado de envelhecer. Ainda mais se ouse ostentar este crime pretendendo engajar-se no espaço público. Que é o espaço do consumo e da juventude.
Infelizmente, trata-se de uma juventude ensurdecida pelos fones de ouvido, de uma maturidade prisioneira do gozo imediato que deve ser pago no crediário e de uma velhice surda, propriamente dita, segundo alguns ‘mestres do saber’, como um processo natural.
Esta peça é um golpe baixo nas defesas de negação de tantos “velhistas”. E conseqüentemente merece ser vista e divulgada – ela possui um efeito terapêutico. Se o Ministério da Saúde se importasse de fato, deveria advertir-nos…
Dr. Arnaldo Dominguez – geriatra e psicanalista